CRÍTICA | Cursed - A Lenda do Lago
Entrando mais uma vez no mundo dos contos medievais, a Netflix traz agora uma nova versão das histórias arturianas, com uma série que, seguindo os passos de produções como The Witcher, de 2019, recebe um grande investimento para poder retratar, através de grandes cenários, uma história com uma mitologia já conhecida e bastante explorada.
A série é inspirada no livro homônimo escrito por Tom Wheeler e ilustrado por Frank Miller, esse último sendo responsável por grandes histórias em quadrinhos, como a saga “Batman: O cavaleiro das trevas”, “Demolidor” e “Sin City”. Os dois também fazem parte da produção da Netflix, sendo os produtores executivos da adaptação. A história conta uma nova versão da famosa lenda clássica do Rei Arthur e da espada mágica Excalibur, mostrando o conto de Nimue, uma figura mitológica destinada a se tornar a “Dama do Lago”, personagem recorrente nos contos arturianos antigos.
A inspiração para essa releitura surgiu de ideias de Frank Miller, que se tornou um grande fã dos contos antigos desde que assistiu a animação A Espada Era a Lei (1963), da Disney, quando criança. Para o livro, lançado em 2019, Frank desenhou oito imagens coloridas e 30 em preto e branco.
A trama conta a história de Nimue (Kathrine Langford), uma jovem do mágico povo feérico que, determinada a cumprir as últimas palavras da mãe, decide partir em uma missão para entregar a lendária espada de Excalibur para o mago Merlin (Gustaf Skarsgård), conselheiro do rei Uther Pendragon (Sebastian Armesto). Mas, após conhecer o mercenário Arthur (Devon Terrell), ela entra em dúvida sobre o que deve fazer, devido à perseguição que o povo feérico sofre pelas mãos dos chamados Paladinos Vermelhos, um grupo religioso determinado a extinguir qualquer magia da face da Terra. Eles são liderados pelo Padre Carden (Peter Mullan), um homem cheio de ódio pelo povo mágico, que é acompanhado pelo Monge Choroso (Daniel Sharman), um misterioso soldado usado como a principal arma contra os feéricos.
A produção traz, acertadamente, uma diversidade dentro do elenco. Além dos personagens principais possuírem variadas etnias, vemos um jovem negro como o (futuro) Rei Arthur, bem diferente das adaptações que o retratam como um homem branco e loiro. Além disso, Katherine Langford traz carisma à sua Nimue, fazendo com que a trama se torne mais interessante, já que é ela quem acompanhamos no passar dos 10 episódios. Outro destaque em relação a atuação é o Merlin de Gustaf Skarsgård. O ator, que já era destaque na famosa série Vikings, nos mostra com grande personalidade uma versão acabada do mítico mago, que por algum motivo passado acabou perdendo seus poderes, e terminou se afundando na bebedice e acomodações do castelo do rei.
O primeiro episódio serve para nos situar no universo fantasioso. Vemos um povo mágico, com sua própria cultura e costumes, que ao longo dos demais episódios, vai se mostrando cada vez mais rico, chegando a possuir sua própria linguagem.
Entretanto, o primeiro problema da série é mostrado logo em suas primeiras sequências: a série faz uso de bonitas transições animadas, que apesar de se mostrarem estilosas e convincentes em um primeiro momento, são usadas de maneira excessiva, e acaba muitas vezes por deixar aceleradas sequências que tinham a necessidade de um ritmo mais tranquilo. Além disso, elas chegam muitas vezes a interromper diversas cenas, trazendo a sensação de que as sequências estão mal acabadas, como se algo estivesse faltando.
Com o desenrolar da trama, percebemos que pouca coisa de real relevância acontece, e a narrativa muitas vezes se perde em meio a regras que ora são seguidas, ora são ignoradas e/ou esquecidas. Os personagens, mesmo que interessantes, sofrem com o roteiro, que os faz andar de um lado ao outro sem um objetivo concreto ou justificável. A narrativa, que poderia ser resumida em menos capítulos, acaba ficando arrastada em meio à construção do universo e das relações entre cada um em tela, e é somente a riqueza da mitologia apresentada que faz com que os capítulos não sofram tanto com isso.
O desenrolar dos episódios acaba sendo bastante afetado, com o roteiro forçando muitos personagens a tomarem decisões importantes somente no último episódio, como é o caso do personagem Monge Choroso (Daniel Sharman). Isso faz com que a série tenha um ritmo inconstante, trazendo desculpas simplistas demais como justificativa.
No fim das contas, Cursed - A Lenda do Lago mostra um grande potencial, devido a sua mitologia interessante e personagens que prendem nossa atenção e curiosidade, porém acaba se perdendo em meio a tantas facilitações e atalhos mal conduzidos pelo roteiro.
Por Pedro Dourado.