Instituto de Cinema de SP

Crítica | Lady Bird: A Hora de Voar

Greta Gerwig ficou conhecida por suas atuações em diversos filmes independentes norte-americanos. Muito envolvida com o movimento Mumblecore, um peculiar subgênero do cinema alternativo, Greta foi acumulando trabalhos entre 2006 e 2010, onde desenvolvia, junto de suas elogiadas interpretações, inúmeras participações na criação de roteiros (infelizmente, não tendo sido creditada muitas vezes pelo trabalho). Mas foi apenas em 2017, após fazer parte de diversos filmes de considerável sucesso, como Frances Ha (2012), Mulheres do Século 20 (2016) e Jackie (2016), que ela levou um de seus próprios roteiros para as telas de cinema.


Em seu primeiro longa-metragem como diretora, Greta Gerwig resolveu voltar às suas origens. Nascida e criada em Sacramento, capital da Califórnia, a diretora decidiu trazer sua cidade-natal como o grande cenário, e um dos principais personagens de seu filme de estreia. 


Lady Bird: A Hora de Voar foi lançado originalmente em novembro de 2017, e nos conta a história de Christine McPherson, ou Lady Bird (Saoirse Ronan), como a personagem insiste em ser chamada. Ela é uma jovem estudante do ensino médio que, assim como qualquer jovem de sua idade, passa por diversas correrias e dificuldades, e acaba lidando com elas da maneira menos madura possível. 


Acompanhamos então uma interessante jornada, que mostra muito bem a transformação da personagem. Situações como enfrentar a pressão para entrar em uma boa faculdade, aguentar os embates com a mãe (Laurie Metcalf), ou até passar pelas surpresas e alegrias de um primeiro romance, acabam demonstrando o desespero e ambição da garota por se livrar de Sacramento, lugar que a faz se sentir sufocada e sempre frustrada.


Por isso, Lady Bird se dedica das mais variadas maneiras para tirar boas notas e ter um currículo impecável, e isso inclui a destruição de material alheio ou até trapaças nos momentos de provas. Junto a seus controversos esforços, a jovem também se lamenta por morar “do lado errado dos trilhos”, maneira pouco amistosa com que chama a região onde vive, sonhando, junto à melhor amiga Julie (Beanie Feldstein), com o alto padrão de vida dos moradores das mansões da cidade.


Em meio a tudo isso, a personagem nos leva por um caminho cheio de erros, decisões questionáveis e frustrações, atitudes que mostram nela uma busca por liberdade daquilo que ela mesmo acredita estar impedindo-a de crescer. Mas mesmo lutando contra situações financeiras delicadas, expectativas e imposições, Christine começa a descobrir quem ela é, e à medida que vemos seu amadurecimento enquanto encara o último ano da escola, vemos também sua reconexão com sua cidade natal, o grande palco de sua evolução. 


O filme é um excelente retrato das vivências e pensamentos de Greta Gerwig. A diretora e roteirista nos leva, de maneira leve e extremamente natural, por um exercício de nos conectarmos novamente com nossas origens, e isso nos traz um entendimento mais imersivo da trama. Temas como primeiras experiências, frustrações e decisões erradas são mostrados como algo natural, completamente humano.


Tendo isso em mente, podemos compreender muito mais as relações que os personagens em tela estão vivendo. Acima de tudo, o filme fala sobre amadurecimento, e a personagem de Lady Bird passa essa transformação de maneira muito coerente, através de grandes e brilhantes diálogos. Em certo momento do filme, Christine decide levar mais sua opinião em conta, mas não de maneira tão egoísta, como em situações anteriores. A personagem mostra seu aprendizado ao mostrar que entendeu o que realmente deveria ser valorizado, e decide voltar atrás em suas escolhas. E é claro que a grande atuação de Saoirse Ronan trás à personagem uma veracidade ainda mais impressionante. Conseguimos de fato entender e nos relacionar com ela, apesar de todos os “erros” cometidos. 


Apesar de o grande destaque entre as atuações ser o de Saoirse no papel principal, o restante do elenco nos encanta com grandes interpretações, sendo outro destaque Laurie Metcalf, interpretando Marion, a mãe da protagonista. As duas juntas são impecáveis, e trazem um embate entre mãe e filha muito divertido e emocionante de se acompanhar, embora frustrante em alguns momentos. A direção de Greta Gerwig é outro trunfo da produção, sendo o grande condutor da trama, capaz de nos transportar para esse “mundo fantástico” que é a vida de Lady Bird.


 


O filme concorreu ao Oscar de 2018 nas categorias Melhor Roteiro Original, Melhor Atriz, Melhor Atriz Coadjuvante, Melhor Filme e Melhor Direção, o que fez Greta Gerwig se tornar, na época, a 5ª mulher a ser indicada ao prêmio.



Por Pedro Dourado.

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