CRÍTICA | Midsommar
Nos últimos anos, o gênero de horror vem trazendo novos filmes com visões diferenciadas das anteriores. Terror psicológico e com muitos simbolismos são características desse novo cinema, que tem como principais nomes os diretores Jordan Peele (Corra!, Nós) e Ari Aster (Hereditário).
Ari Aster é um diretor e roteirista norte-americano que chamou a atenção dos críticos ao dirigir o filme Hereditário (Hereditary, 2018), por se tratar de uma nova forma de criar o cinema de suspense e terror. Portanto, seu segundo trabalho na direção foi muito aguardado, despertando a curiosidade para saber como seria Midsommar – O Mal Não Espera a Noite (2019).
À primeira vista, o filme pode parecer mais um terror hollywoodiano em que um grupo de amigos viaja para um lugar isolado no meio da natureza e passam por momentos de horror, perseguição e morte. Filme que se encaixa na categoria do gênero folk horror. Mas Midsommar apresenta muito mais do que isso. Um suspense psicológico com muitos simbolismos, crescimento narrativo de personagens, momentos de tensão e aflição.
No filme acompanhamos a personagem Dani (Florence Pugh) que, após passar por um grande trauma familiar, se encontra em uma crise no seu relacionamento com Christian (Jack Reynor), seu namorado de longa data. Desde as primeiras cenas do filme, observamos que Dani se sente muito sozinha, ela busca uma comunicação com os familiares e amigos, mas não consegue. Portanto tenta se apoiar em Christian, para lidar com a solidão e seus sentimentos de perda, mas acaba se sentindo desamparada e culpada por pedir atenção.
Christian e seus amigos, Pelle (Vilhelm Blomgren), Mark (Will Poulter), Josh (William Jackson Harper), planejaram uma viagem para o vilarejo de Harga na Suécia, onde Pelle foi criado, com o objetivo de participar das festividades do ritual pagão Midsommar e conhecer mais sobre os costumes locais. Dani, força sua ida a essa viagem, para que possa estar perto do namorado.
O grupo chega ao vilarejo para as festividades, e Pelle nos apresenta às pessoas e ao local. Uma comunidade pagã com forte contato com a natureza, onde de acordo com sua idade você desempenha um determinado papel, de aprendizes a anciões. O grupo se junta aos moradores do vilarejo e se acomodam no galpão principal.
Nesse cenário, foi feita uma decoração que proporciona a utilização de uma importante ferramenta narrativa, o foreshadowing. Com esse popular recurso, o autor antecipa determinado desfecho ao público, dando pistas do que está por vir. No filme ele é utilizado através de painéis decorativos, feitos pela Direção de Arte, que foram pintados nas paredes do galpão. As gravuras nos painéis mostram situações dos rituais dessa sociedade, e mostram ao espectador o desfecho de alguns personagens.
Conforme os rituais vão acontecendo, conhecemos mais sobre a história do vilarejo. Embora sejam rituais de morte, que causam angústia e aflição, uma das principais preocupações de Dani é seu relacionamento com Christian, ela ainda se sente desamparada pelo namorado que não lhe dá atenção. Mas é por causa desse sentimento que ocorre uma importante virada na história da protagonista. Ao ser afastada pelo namorado, Dani se aproxima da comunidade. E encontra naquelas pessoas um abrigo, um apoio, inclusive para seus momentos de dor (evidenciados pela cena em que Dani chora e as mulheres ao seu redor choram e sentem junto sua dor). Ao participar de um dos rituais, Dani é coroada a Rainha de Maio de Midsommar, um símbolo de fertilidade da terra.
Enquanto isso, Christian participa de um ritual de fertilidade, um ato na tentativa de engravidar a irmã de Peele e trazer vida nova ao vilarejo. Ao ver essa cena, ficamos desacreditados de sua atitude, mas é possível que ele tenha participado desse ritual de maneira forçada, pois na cena que antecede o ritual, vemos Christian tomando um líquido diferente dos demais, e sendo levado até o galpão onde tudo aconteceria. Dani vê o ato e se sente traída. Após colocar para fora toda sua dor, ela observa seu namorado participar do último ritual, que o leva à morte.
A cena final, mostra um close de Dani, com a coroa e manto de flores coloridas que indicam sua posição como Rainha de Maio. Ela então, abre um sorriso, enquanto vê a morte de seu namorado e amigos pelo fogo. Nesse momento é importante ressaltar a interpretação de Florence Pugh, esse sorriso, para alguns, pode parecer um sentimento de vingança, onde finalmente Dani cansa de tentar chamar a atenção de Christian e o deixa. Mas na verdade o que vemos, é uma sensação de liberdade e acolhimento.
No decorrer do filme percebemos que Dani se encontra de certa forma em um relacionamento abusivo, onde a busca por reciprocidade faz ela se sentir culpada para não perder o namorado. Vemos também que ela atravessa um momento de muita solidão e escuridão. Ao fazer essa viagem para o vilarejo, ela se encontra em um lugar onde sempre há luz, pois os dias e noites são claros. Aqui temos um simbolismo relacionado à luz e à escuridão, onde só é possível enxergar suas dores e se aprofundar no seu interior em lugares de muita luz. E depois de sofrer, mas encontrar apoio e abrigo, é possível alcançar sua liberdade e sair da solidão. Esse é o principal significado do sorriso final: liberdade.
Com muitos simbolismos, uma direção de arte impecável, que participa da história, recursos narrativos que proporcionam um suspense aflitivo e angustioso, imagens fortes que impressionam pela violência, Midsommar se torna um dos principais terrores psicológicos do novo cinema de gênero. Não deixe de assistir, ele se encontra disponível na plataforma da Amazon Prime Video.
Por Juliana von Zuben