Instituto de Cinema de SP

Representação e representatividade das mulheres lésbicas no Cinema

A invisibilização da causa LGBTQIA+ na sociedade, infelizmente, não é nenhuma novidade. Porém, considerando o cinema como espaço de divulgação de muitas ideias, histórias e seu caráter artístico, é preocupante a falta tanto de representação nas histórias, como de representatividade nesse meio, cujos profissionais que se identificam com a causa continuam sendo minoria.


Além disso, apesar da sensação de que filmes e séries LGBTQIA+ estão sendo mais consumidos, o que não vemos é que poucas são as obras que conseguem sair deste nicho e atingir o público em geral. Ultimamente, com o advento dos serviços de streaming, e a demanda por direitos sociais, civis e pautas mínimas como igualdade, mas que sempre foram negadas à uma parcela da população, temos a impressão de que filmes com essa temática são algo decorrente de um movimento recente. Contudo, assim como as demandas por direito e igualdade sempre existiram, mas foram invisibilizadas, o mesmo acontece com essas obras.


Por outro lado, para garantir que romances lésbicos ou gays não seriam abordados nas telonas, diversas leis foram criadas, como o Código Hays nos Estados Unidos, que vigorou de 1930 a 1966. A censura não parou por aí e, inclusive no Brasil, nos ameaça o tempo todo. Em decorrência disso, além da falta de representação, quando alguma personagem lésbica aparecia em um filme era sempre retratada de forma estereotipada e, caminhando para os anos 80, eram vistas como piada, sempre definidas apenas por sua sexualidade.


Independente da época, porém, um fator era (e ainda é) constante: a invisibilidade. Até mesmo em roteiros adaptados de uma história original que conta com um romance lésbico como um dos pontos centrais de sua trama teve esse aspecto específico da história retirado e resumido a um beijo, como é o caso de A Cor Púrpura (1985, Steven Spielberg). Foi apenas em 1990 que esse assunto começou a ser abordado mais abertamente na TV, a exemplo do sitcom Ellen (1994-1998), no qual a personagem principal diz ser lésbica em um dos episódios, ao passo em que a atriz e comediante Ellen DeGeneres - que dava vida à protagonista -, fez a mesma declaração publicamente.


Apesar disso, a indústria do entretenimento, majoritariamente masculina e heterossexual, sujeita as mulheres ao machismo estrutural desse ambiente e as mulheres lésbicas não fogem dessa realidade. A visão machista sobre as mulheres lésbicas, influenciada ainda pela heteronormatividade, resultou em retratações geralmente de forma mais masculinizada ou erotizadas. Hoje, apesar de haver uma mudança na forma como tais personagens são representadas na frente das câmeras, é evidente a falta de representatividade por trás delas, e um exemplo disso é o caso do filme Azul é a Cor Mais Quente.


Dirigido por Abdellatif Kechiche, o filme de 2013 conta com uma cena de sexo de sete minutos e que demorou 10 horas para ser filmada. Após a divulgação do projeto, as atrizes contaram sobre os abusos sofridos pelo diretor, desde a utilização de protetores íntimos que machucavam, muito tempo sem roupa no set, além de colocar a mão no corpo das meninas para demonstrar como gostaria que as cenas fossem feitas, ou seja, tudo e mais um pouco de atitudes que não podem, em hipótese alguma, acontecer dentro de um set de filmagem.


A importância da representatividade por trás das câmeras vem à tona quando percebemos que, caso as minorias ocupassem os lugares de poder historicamente dominados por homens heterossexuais, como direção e produção, por exemplo, além da diferença em como as personagens seriam retratadas, a forma como as atrizes seriam tratadas no set também seria outra.


Hoje, ao mesmo tempo em que há uma maior visibilidade, voz e abertura para se falar sobre essas temáticas (comparado ao passado), vivemos uma onda global de conservadorismo e tentativa do retorno de “valores” ou condutas sociais há muito ultrapassados, principal motivo pelo qual devemos continuar lutando e dando visibilidade para histórias que sempre estiveram ali.  


 


Por Ana Clara P.S.M.O.

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